José Manuel Moran
Por que será que os meios de comunicação cativam e provocam tanto impacto?
Uma primeira é, sem dúvida, começar pelo sensorial, pelo afetivo, pelo que toca o aluno antes de falar de idéias, de conceitos, de teorias. Partir do concreto para o
abstrato, do imediato para o mediato, da ação para a reflexão, da produção para a teorização.
O vídeo explora também e, basicamente, o ver, o visualizar, o ter diante de nós as situações, as pessoas, os cenários, as cores, as relações espaciais (próximodistante, alto-baixo, direita-esquerda, grande-pequeno, equilíbrio-desequilíbrio).
Desenvolve um ver entrecortado - com múltiplos recortes da realidade - através dos planos - e muitos ritmos visuais: imagens estáticas e dinâmicas, câmera fixa ou em movimento, uma ou várias câmeras, personagens quietos ou movendo-se, imagens ao vivo, gravadas ou criadas no computador. Um ver que está situado no presente, mas que o interliga não linearmente com o passado e com o futuro.
Pense num vídeo visto recentemente por você. Preste atenção à narração nele existente. Certamente que nesse vídeo, como na maioria deles, é possível identificar que o ver está apoiando o falar, o narrar, o contar estórias. A fala aproxima o vídeo do cotidiano, de como as pessoas se comunicam habitualmente. Os diálogos expressam a fala coloquial, enquanto o narrador (normalmente em off) "costura" as cenas, as outras falas, dentro da norma culta, orientando a significação do conjunto. A narração falada ancora todo o processo de significação.
A música e os efeitos sonoros servem como evocação, lembrança (de situações passadas), de ilustração - associados a personagens do presente, como nas telenovelas- e de criação de expectativas, antecipando reações e informações.
O vídeo é também escrita. Os textos, legendas, citações aparecem cada vez mais na tela, principalmente nas traduções (legendas de filmes) e nas entrevistas com estrangeiros. A escrita na tela hoje é fácil através do gerador de caracteres, que permite colocar na tela textos coloridos, de vários tamanhos e com rapidez, fixando ainda mais a significação atribuída à narrativa falada.
A organização da narrativa televisiva, principalmente a visual, não se baseia somente - e muitas vezes, não primo rdialmente - na lógica convencional, na coerência interna, na relação causa-efeito, no princípio de não-contradição, mas
numa lógica mais intuitiva, mais conectiva. Imagens, palavras e música vão se agrupando segundo critérios menos rígidos, mais livres e subjetivos dos produtores que pressupõem um tipo de lógica da recepção também menos racional, mais intuitiva.
A imagem na televisão, cinema e vídeo é sensorial, sensacional e tem um grande componente subliminar, isto é, passa muitas informações que não captamos claramente.
O olho nunca consegue captar toda a informação. Então escolhe um nível que dê conta do essencial, do suficiente para dar um sentido ao caos, de organizar a multiplicidade de sensações e dados. Foca a atenção, em alguns aspectos analógicos, nas figuras destacadas, nas que se movem e com isso conseguimos acompanhar uma estória. Mas deixamos de lado, inúmeras informações visuais e sensoriais, que não são percebidas conscientemente. A força da linguagem audiovisual está em que consegue dizer muito mais do que captamos, chegar simultaneamente por muitos mais caminhos do que conscientemente percebemos e encontra dentro de nós uma repercussão em imagens básicas, centrais, simbólicas, arquetípicas, com as quais nos identificamos ou que se relacionam conosco de alguma forma.
É uma comunicação poderosa, como nunca antes a tivemos na história da humanidade e as novas tecnologias de multimídia e realidade virtual só estão tornando esse processo de simulação muito mais exacerbado, explorando-o até limites inimagináveis.
TV e vídeo são sensoriais, visuais, linguagem falada, linguagem musical e escrita. Linguagens que interagem superpostas, interligadas, somadas, não separadas. Daí a sua força. Nos atingem por todos os sentidos e de todas as maneiras. Televisão e vídeo nos seduzem, informam, entretêm, projetam em outras realidades (no imaginário) em outros tempos e espaços.
Televisão e vídeo combinam a comunicação sensorial-sinestésica, com a audiovisual, a intuição com a lógica, a emoção com a razão. Integração que começa pelo sensorial, pelo emocional e pelo intuitivo, para atingir posteriormente o racional.
TV e vídeo encontraram a fórmula de comunicar-se com a maioria das pessoas, tanto crianças como adultas. O ritmo torna-se cada vez mais alucinante (por exemplo nos videoclipes). A lógica da narrativa não se baseia necessariamente na causalidade, mas na contigüidade, em colocar um pedaço de imagem ou estória ao lado da outra. A sua retórica conseguiu encontrar fórmulas que se adaptam perfeitamente à sensibilidade do homem contemporâneo. Usam uma linguagem concreta, plástica, de cenas curtas, com pouca informação de cada vez, com ritmo acelerado e contrastado, multiplicando os pontos de vista, os cenários, os personagens, os sons, as imagens, os ângulos, os efeitos.
Os temas são pouco aprofundados, explorando os ângulos emocionais, contraditórios, inesperados. Passam a informação em pequenas doses (compacto), organizadas em forma de mosaico (rápidas sínteses de cada assunto) e com apresentação variada (cada tema dura pouco e é ilustrado).
Se parar e refletir verá que as mensagens dos meios audiovisuais exigem pouco esforço e envolvimento do receptor. Este tem cada vez mais opções, mais possibilidades de escolha (controle remoto, canais por satélite, por cabo, escolha de filmes em vídeo). Começamos a ter maior possibilidade de interação: televisão bidirecional, jogos interativos, navegar pelas imagens e por bancos de dados da Internet; acessar à Internet pela televisão e realizar inúmeros serviços virtuais na tela: compras, comunicação, aulas. A possibilidade de escolha e participação e a liberdade de canal e acesso facilitam a relação do espectador com os meios.
As linguagens da TV e do vídeo respondem à sensibilidade dos jovens e da grande maioria da população adulta. São dinâmicas, dirigem-se antes à afetividade do que à razão. O jovem lê o que pode visualizar, precisa ver para ompreender. Toda a sua fala é mais sensorial-visual do que racional e abstrata. Lê, vendo.
A linguagem audiovisual desenvolve múltiplas atitudes perceptivas: solicita constantemente a imaginação e reinveste a afetividade com um papel de mediação primordial no mundo, enquanto que a linguagem escrita desenvolve mais o rigor, a organização, a abstração e a análise lógica.
Um dos critérios principais de contar é a contigüidade, a justaposição por algum tipo de analogia, de associação por semelhança ou por oposição, por contraste. Ao colocar pedaços de imagens ou cenas juntas, em seqüência, criam-se novas relações, novos significados, que antes não existiam e que passam a ser considerados aceitáveis, "naturais", "normais". Colocando, por exemplo, várias matérias em seqüência, num mesmo bloco e em dias sucessivos - como se fossem capítulos de uma novela -, sobre o assassinato de uma atriz, o de várias crianças e outros crimes semelhantes, acontecidos no Brasil e em outros países, multiplica-se a reação de indignação da população, o seu desejo de vingança. Isto favorece os defensores da pena de morte; o que não estava explícito em cada reportagem e nem tal vez fosse a intenção dos produtores.
A televisão estabelece uma conexão aparentemente lógica entre mostrar e demonstrar. Mostrar é igual a demonstrar, a provar, a comprovar. A força da imagem é tão evidente que se torna difícil não fazer essa associação comprobatória ("se uma imagem me impressiona, é verdadeira"). Também é muito comum a lógica de generalizar a partir de uma situação concreta. Do individual, tendemos ao geral. Uma situação isolada converte-se em situação paradigmática, padrão. A televisão, principalmente, transita continuamente entre as situações concretas e a generalização. Mostra dois ou três escândalos na família real inglesa e tira conclusões sobre o valor e a ética da realeza como um todo.
Ao mesmo tempo, o não mostrar equivale a não existir, a não acontecer. O que não se vê, perde existência. Um fato mostrado com imagem e palavra tem mais força que se somente é mostrado com palavra. Muitas situações importantes do cotidiano perdem força, por não ter sido valorizadas pela imagem-palavra televisiva.
Nem sempre se percebe, mas o vídeo está umbilicalmente ligado à televisão e a um contexto de lazer, de entretenimento, que passa imperceptivelmente para a sala de aula. Vídeo, na cabeça dos alunos, significa descanso e não "aula", o que modifica a postura, as expectativas em relação ao seu uso. Precisamos aproveitar essa expectativa positiva para atrair o aluno para os assuntos do nosso planejamento pedagógico. Mas ao mesmo tempo, saber que necessitamos prestar atenção para estabelecer novas pontes entre o vídeo e as outras dinâmicas da aula.
A eficácia de comunicação dos meios eletrônicos, em particular da televisão, se deve também à capacidade de articulação, de superposição e de combinação de linguagens diferentes - imagens, falas, música, escrita - com uma narrativa fluida, uma lógica pouco delimitada, gêneros, conteúdos e limites éticos pouco precisos, o que lhe permite alto grau de entropia, de flexibilidade, de adaptação à concorrência, a novas situações. Num olhar distante tudo parece igual, tudo se repete, tudo se copia; ao olhar mais de perto, por trás da fórmula conhecida, há mil nuances, detalhes que introduzem variantes adaptadoras e diferenciadoras.
A força da linguagem audiovisual está em que consegue dizer muito mais do que captamos, chegar simultaneamente por muitos mais caminhos do que conscientemente percebemos e encontra dentro de nós uma repercussão em imagens básicas, centrais, simbólicas, arquetípicas, com as quais nos identificamos ou que se relacionam conosco de alguma forma.
Fonte: E-Proinfo
Nenhum comentário:
Postar um comentário